Eram
bonitos juntos, diziam as moças. Um doce de olhar. Sem terem exatamente
consciência disso, quando juntos os dois aprumavam ainda mais o porte e, por
assim dizer, quase cintilavam, o bonito de dentro de um estimulando o bonito de
fora do outro, e vice-versa. Como se houvesse entre aqueles dois, uma estranha
e secreta harmonia.
Não me aproximo porque, veja bem, sabe lá quem habita a tua solidão. Hesito.
Recuo.(...) Nós poderíamos ser amigos e trocar confidências. Assistiríamos a
filmes, taça de vinho nas mãos, e tu me detalharias as tuas paixões e
desatinos. Nós poderíamos ser amantes que bebem champanhe pela manhã aos beijos
num hotel em
Paris. Caminharíamos pela beira do Sena, e eu te olharia
atenta, numa tentativa indisfarçável de gravar o momento e guardá-lo comigo até
o fim dos meus dias. Ou poderíamos ser apenas o que somos, duas pessoas com uma
ligação estranha, sutilezas e asperezas subentendidas, possibilidades de
surpresas boas. Ou não. Difícil saber. Bato minhas asas em retirada. Tu dormes,
e nos teus sonhos mais secretos, não posso entrar. Embora queira. À distância,
permaneço te contemplando. E me pergunto se, quem sabe um dia, na hora certa,
nosso encontro pode acontecer inteiro. Porque tu és o único que habita a minha
solidão.
(Caio Fernando Abreu)
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