O que me interessa no amor, não é apenas o que ele
me dá,
mas principalmente, o que ele tira de mim:
a carência, a ilusão de autossuficiência,
a solidão maciça, a boemia exacerbada para suprir
vazios.
Ele me tira essa disponibilidade eterna para
qualquer um,
para qualquer coisa, a qualquer hora.
Ele apazigua o meu peito
com uma lista breve de prós e contras.
Mas me dá escolhas.
Eu me percebo transformada pelo que o amor
tirou de mim por precisar de espaço amplo
e bem cuidado para se instalar.
O amor tira de mim a armadura,
pois não consigo controlar a vulnerabilidade
que vem com ele; tira também a intransigência.
O amor me ensina a
negociar os prazos,
a superar etapas, a
confiar nos fatos.
O amor tira de mim a
vontade de desistir com facilidade,
de ir embora antes de
sentir vontade,
de abandonar sem saber
por quê.
E é por isso que o amor me assombra
tanto quanto delicia.
Porque não posso virar as
costas
pra uma mania quando ela
vem
de uma pessoa inteira.
Porque eu não posso fingir que quero estar sozinha
quando o meu ser transborda companhia.
O amor me tira coisas que eu não gosto,
coisas que eu talvez gostasse,
mas me dá em dobro o que nunca tive:
um namoramento por ele
mesmo.
O amor me tira aquilo
que não serve mais
e que me compunha antes.
O amor tirou de mim tudo
que era falta.
(Marla de Queiroz)